Cilto José Rosembach


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Tecnologia Digitais Um novo ambiente na Igrej!

06/07/2014 15:16

 Assim se intitulava uma coletânea de entrevistas sobre o impacto da Rede na nossa vida, organizada por John Brockman, e que apareceu em 2011 nos EUA. «A Internet está a mudar o nosso modo de pensar?» As recentes tecnologias digitaisdeixaram de ser ferramentas, isto é, instrumentos completamente externos ao nosso corpo e à nossa mente. A rede não é um instrumento, mas um «ambiente» no qual vivemos. Os «dispositivos», isto é, os objetos que temos à mão (na verdade muitas vezes mais pequenos que uma mão) e que nos permitem estar cada vez mais conectados, tendem a simplificar-se, a perder consistência, para se tornarem transparentes em relação à dimensão digital da vida. São portas abertas que raramente se fecham. Quem desliga, hoje em dia, um iPhone? Ele é recarregado, «silenciado», mas raramente desligado. Tem gente que nem sabe como desligá-lo. E se possuímos umsmartphone ligado no bolso, estamos sempre na Rede.

Por isso mesmo, cresce a quantidade de estudos acerca da forma como a Rede muda a nossa vida diária e, em geral, a nossa relação com o mundo e as pessoas que nos cercam. Mas, se a Rede transforma o nosso modo de viver e de pensar, não mudará (...e já está a mudar) também o nosso modo de pensar e viver a fé? (...)

Comecei a explorar um território que me pareceu, desde início ainda selvagem, pouco frequentado. A busca de uma bibliografia levou-me a verificar que já fora escrito muito sobre a dimensão pastoral, que considera a Rede um instrumento de evangelização. Todavia, pareceu-me muito pouco explorada a reflexão teológico-sistemática. As minhas perguntas eram: que impacto tem a Rede no modo de compreender a Igreja e a comunhão eclesial? E que impacto tem sobre o modo de pensar a Revelação, a Graça, a Liturgia, os Sacramentos... e os temas clássicos da teologia? (...)

A necessidade de enfrentar corajosamente estas perguntas começa a ser compartilhada. O próprio papa Ben to XVI, em 28 de fevereiro de 2011, dirigiu-se, nos seguintes termos, aos participantes da assembleia geraldo Pontifício Conselho das Comunicações Sociais:

«Não se trata somente de exprimir a mensagem evangélica na linguagem atual, mas é preciso ter a coragem de pensar de maneira mais profunda, como aconteceu em outras épocas, a relação entre a fé, a vida da Igreja e as transformações que o homem está vivendo. É o esforço para ajudar todos os que são responsáveis pela Igreja a serem capazes de entender, interpretar e falar a «nova linguagem» dos media, na função pastoral (verAetatis novae, 2), em diálogo com o mundo contemporâneo, perguntando-se: quais os desafios que o «pensamento digital» coloca à fé e à teologia? Que perguntas e exigências? O mundo da comunicaçãointeressa a todo o universo cultural, social e espiritual da pessoa humana. Se as novas linguagens possuem um impacto sobre o modo de pensar e de viver, isto diz respeito de certa forma também ao mundo da fé, sua inteligência e sua expressão. A teologia, segundo uma definição clássica, é a inteligência da fé, e bem sabemos como o entendimento, considerado como conhecimento refletido e crítico, não se encontra alheio às mudanças culturais em curso. A cultura digital traz novos desafios à nossa capacidade de falar e escutar uma linguagem simbólica que trata da transcendência. O próprio Jesus ao anunciar o Reino soube utilizar os elementos da cultura e do ambiente de seu tempo: a multidão, o campo, os festins, as semeaduras, etc. Hoje, somos chamados a descobrir, também na cultura digital, os símbolos e metáforas importantes para as pessoas, que podem auxiliar, ao comunicarmos o Reino de Deus ao homem contemporâneo.»

O livro que o leitor tem em mãos é, portanto, a minha primeira resposta àquele apelo que agora já tem um fôlego amplo e ecuménico. No entanto, pensar a fé em tempos da Rede não é só uma reflexão ao serviço da fé. A aposta é muito mais elevada e global. Se os cristãos refletem na Rede, não é somente para aprenderem a «usá-la» bem, mas por que foram chamados a ajudar a humanidade a compreender o significado profundo da própria Rede, no projeto de Deus: não como um instrumento a ser «usado», mas como um ambiente a ser «habitado». Como escreveu João Paulo II em 2005, na Carta apostólica rápido desenvolvimento: «a Igreja, que em virtude da mensagem de salvação que lhe foi confiada pelo seu Senhor, é também mestra em humanidade, sente o dever de oferecer o seu contributo para uma melhor compreensão das perspetivas e das responsabilidades relacionadas com os atuais progressos das comunicações sociais» (n.º 10).

Esta é a maior contribuição da Igreja à Rede, ao menos do seu ponto de vistaajudar o homem a entender melhor o significado profundo da comunicação e dos media, sobretudo porque eles «influem na consciência dos indivíduos, formam a sua mentalidade e determinam a sua visão das coisas» (Ibid.). No desenvolvimento da comunicação, a Igreja vê a ação de Deus que conduz a humanidade para uma realização plena. A Internet, com a sua capacidade de ser, ao menos potencialmente, um espaço de comunhão, faz parte do caminho do homem para esta consumação em Cristo. É preciso, então, ter uma visão espiritual da Rede, vendo Cristo que chama a humanidade a estar cada vez mais unida e ligada. (...)

Foi o poeta Gerard Manley Hopkins que me ajudou a en tender o papel da inovação tecnológica; o jazz fez-me entender o papel das redes sociais; os teólogos – de Tomás de Aquino a Teilhard de Chardin – esclareceram-me em relação às forças que tornam o homem atuante no mundo, participando da Criação, e que o elevam a uma meta que o supera, bem além de qualquer excesso cognitivo. É a pesquisa inesgotável de sentido que me fez entender o valor do cabo usb que tenho em mãos. E sei que o meu iPad tem a ver com o meu desejo inextinguível de conhecer o mundo, en quanto o meu Galaxy Note me diz (mesmo quando está silencioso) que eu não sou feito para ficar sozinho. Mas é a poesia de Whitman que me dá o prazer do progresso. E é Eliot que me faz estar atento, para não cair nas suas armadilhas. Mas é também Flannery O’Connor que me faz entender que «a graça habita no mesmo território do diabo» e, pouco a pouco, o invade. E, portanto, entendo que, mesmo vendo tanto mal na Rede, não posso parar e descansar sobre os louros de um juízo negativo, se desejo ver Deus operando no mundo. E, quando vejo a eletricidade invadir o meu computador, fazendo-o ligar-se e mover-se prodigiosamente, é a poesia de Karol Wojtyła, que lia eletricamente, o sacramento da Confirmação, que me leva ao espanto.

Além disso, a tecnologia exprime o desejo do homem por uma plenitude que sempre o supera, tanto ao nível da presença e das relações como ao nível do conhecimento: o ciberespaço ressalta a nossa finitude e exige uma completude. Buscá-la significa, de certa forma, operar num campo em que a espiritualidade e a tecnologia se cruzam. (...)

Ao entregar às mãos do leitor este volume, gostaria de retomar alguns elementos que compõem uma espécie de premissa concetual. Antes de mais nada, repito que a pergunta certa, ao começar a leitura, diz respeito ao novo contexto existencial gerado pelos media e a consequente «transformação antropológica». Qual é o seu significado para a fé? Em que mundo vivemos? É o mesmo de antigamente? À pergunta, «onde vives?», o que é que responderemos? Habitamos também um território digital. Que valor assume, na era digital, o facto de que «o Verbo se fez carne e veio habitar no meio de nós»?

Também me parece importante lembrar que o objetivo da obra é o de abrir cenários e alimentar o desejo de não se deter nos «prodígios» da técnica, mas de aprofundar e compreender como o mundo está a mudar e como esta mudança possui um impacto na vida de fé. As tecnologias são «novas» não simplesmente porque diferentes em relação àquilo que as precedeu, mas porque mudam profundamente o próprio conceito de experiência. Trata-se de evitar a ingenuidade de acreditar que estejam disponíveis para nós sem modificar em nada o nosso modo de perceber a realidade. A tarefa da Igreja, assim como de todas as comunidades eclesiais, é a de acompanhar o homem no seu caminho, e a Rede faz parte integrante deste percurso de modo irreversível.